Carta aberta à sociedade do município de Jequitinhonha nota contra o fechamento de escolas no campo do município de Jequitinhonha - MG

A Cáritas Diocesana de Almenara - Baixo Jequitinhonha, por meio desta carta, manifesta
sua indignação e repúdio contra o descaso do poder público e o fechamento de 5 escolas
municipais localizadas no campo do Município Jequitinhonha/ MG, no Vale do
Jequitinhonha (EM. Acúrcio da Cunha Peixoto, EM. Mestra Ione Soares da Cunha, EM.
Mestra Maria Cândida da Silva e as escolas da Comunidade Porto Alegre e Maranhão).


A Cáritas Diocesana de Almenara - Baixo Jequitinhonha, por meio desta carta, manifesta sua indignação e repúdio contra o descaso do poder público e o fechamento de 5 escolas municipais localizadas no campo do Município Jequitinhonha/ MG, no Vale do Jequitinhonha (EM. Acúrcio da Cunha Peixoto, EM. Mestra Ione Soares da Cunha, EM. Mestra Maria Cândida da Silva e as escolas da Comunidade Porto Alegre e Maranhão).


Publicado há 6 anos

A Cáritas Diocesana de Almenara - Baixo Jequitinhonha, por meio desta carta, manifesta sua indignação e repúdio contra o descaso do poder público e o fechamento de 5 escolas municipais localizadas no campo do Município Jequitinhonha/ MG, no Vale do Jequitinhonha (EM. Acúrcio da Cunha Peixoto, EM. Mestra Ione Soares da Cunha, EM. Mestra Maria Cândida da Silva e as escolas da Comunidade Porto Alegre e Maranhão). Em reuniões nas referidas escolas, o secretário Municipal de Educação de Jequitinhonha, o Sr. Thiago Machado Matos, informou as comunidades sobre o fechamento das escolas, as quais atendem estudantes (crianças até 11 anos de idade), das séries iniciais do ensino fundamental. Informou também que estes alunos seriam matriculados em escolas da cidade. Em notas divulgadas pela secretaria (conforme foto abaixo), percebe-se um retrocesso de décadas no trato com a educação do campo no município.

Fonte: Facebook da Secretaria Municipal de Educação: https://www.facebook.com/SecretariaMunicipal-de-Educa%C3%A7%C3%A3o-de-Jequitinhonha-809310875747048/.

No entanto, são ideias preconceituosas que remetem ao modelo de educação rural, o qual vem sendo desconstruído por organizações e o movimento "Por uma Educação do Campo". Por muitas décadas as propostas educativas da escola rural tiveram suas bases edificadas a partir de um contexto marcado pela visão de campo enquanto local atrasado no desenvolvimento e puro nas formas de sociabilidade. O descaso com a educação no meio rural leva a compreensão de que “o lugar de quem estuda é na cidade, e que para continuar na roça, os trabalhadores não necessitam de estudos”. Ainda hoje vemos gestores repetirem a lógica da educação rural, fechando escolas e afirmando que o ensino na cidade é melhor. Lembramos que, em duas das escolas fechadas, a Cáritas construiu em 2015, cisterna para captação de água da chuva, com capacidade para 52 mil litros de água. Tais afirmações emitidas por meio do secretário municipal, depõem contra eles próprios, retirando-se da culpa de negar o direito a uma educação de qualidade aos povos do campo. Se o índice de desenvolvimento da educação é melhor na cidade, seria por negligência do poder público com as escolas do campo? Este modelo educacional defendido por esta gestão desconsidera a própria Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDBEN, que avalia em seu Art. 28:

[...] na oferta de educação básica para a população rural, os sistemas de ensino promoverão as adaptações necessárias à sua adequação às peculiaridades da vida rural e de cada região, especialmente: I - Conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às reais necessidades e interesses dos alunos da zona rural; II - Organização escolar própria, incluindo adequação do calendário escolar às fases do ciclo agrícola e às condições climáticas; III - Adequação à natureza do trabalho na zona rural.

Destacamos que, desde a década de 1990 a Educação do Campo vem sendo debatida e defendida por movimentos e entidades sociais, educadores/as e universidades como formas de garantir aos povos do campo o direito à educação em suas localidades. Estas lutas coletivas contribuíram para a elaboração de uma legislação que ampara e legitima o direito à universalidade do direito a educação e suas especificidades, contrapondo a lógica da educação rural. A Resolução CNE/CEB nº 1 /2002 institui as Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo. Destacamos um trecho de seu texto que demonstra a responsabilidade dos municípios no atendimento às escolas do campo:

 

Art. 6º O Poder Público, no cumprimento das suas responsabilidades com o atendimento escolar e à luz da diretriz legal do regime de colaboração entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, proporcionará Educação Infantil e Ensino Fundamental nas comunidades rurais, inclusive para aqueles que não o concluíram na idade prevista, cabendo em especial aos Estados garantir as condições necessárias para o acesso ao Ensino Médio e à Educação Profissional de Nível Técnico.

 

Vale lembrar que na Lei Orgânica do município de Jequitinhonha, foram incluídas as Diretrizes da Educação do Campo, no ano de 2011. Entretanto, os gestores ainda não têm praticado esta educação diferenciada nas escolas do campo. Conforme o nosso conhecimento, em algumas escolas os moradores das comunidades fizeram abaixo-assinado não concordando com o fechamento das escolas, como é o caso da comunidade Araçatuba. A presidente da Associação de Mulheres da Comunidade informa que a escola foi construída em terreno doado por um morador, há mais de 40 anos, a partir da luta da comunidade para atender sua demanda. Por isso, a comunidade está indignada com a decisão da Secretaria Municipal de Educação, pois não atenderam a vontade da comunidade de manter a escola funcionando. O secretário de educação justifica que estão diminuindo os percursos dos deslocamentos dos alunos nos ônibus e que alunos que estudam em classes multisseriadas têm um aprendizado inferior aos alunos da cidade, e que os alunos do campo não dão conta de acompanhar os da cidade quando chegam ao 6º ano nas escolas urbanas. No entanto, afirmamos que, transportar os estudantes é desumano, pois os expõe a situações muitas vezes degradantes. Conforme depoimento dos próprios pais, seus filhos estão acordando às 4 horas da manhã, e, muitas vezes chegando em casa após às 14 horas. Alguns chegam a passar mal dentro do ônibus devido ao sono, às vezes a fome diante do tempo de deslocamento até a cidade, e o movimento do veículo por causa das condições ruins das estradas. Além disso, têm ônibus transportando uma quantidade maior do que comporta. Fechar a escola da comunidade é negar o direito à educação, aos estudantes em sua comunidade. Assim, enfatizamos algumas razões para o não fechamento das escolas no campo:

1 - As crianças, adolescentes, jovens e adultos do campo, têm o direito à educação no lugar onde vivem e trabalham, tendo acesso aos conhecimentos produzidos socialmente pela humanidade.

2 - Cabe aos gestores públicos assegurar uma escola de qualidade com condições físicas e pedagógicas adequadas e contextualizadas aos sujeitos do campo.

3 - A Escola do Campo valoriza a história, a vida, a produção e a cultura das comunidades do campo. Nas escolas das cidades, os estudantes perdem a referência de comunidade e identidade do campo. São inseridos numa cultura, que considera o campo lugar do atraso, sendo desmotivados pela distância e preconceitos;

4 - As escolas multisseriadas do campo, que é uma realidade em todo o mundo - precisa deixar de ser vista como problema, o que ela necessita é de infraestrutura, materiais didáticos apropriados, formação específica dos professores/as, currículo contextualizado e supervisão pedagógica permanente;

5 - A escola do campo, faz parte da comunidade campesina, é o espaço de encontro, formação de gerações. Na maioria das comunidades torna-se o único espaço estatal nas comunidades;

6 - A resolução complementar de 2008, reza que: Art. 3º A Educação Infantil e os anos iniciais do Ensino Fundamental serão sempre oferecidos nas próprias comunidades rurais, evitando-se os processos de nucleação de escolas e de deslocamento das crianças (FORTECAMPO, Texto adaptado, 2018). Diante das questões expostas, denunciamos o fechamento destas escolas, desconsiderando totalmente a Legislação específica da Educação do Campo, contrariando inclusive a Lei n. 12.960, de 27 de março de 2014 que trata do fechamento de escolas rurais, indígenas e quilombolas. A Lei estabelece que a comunidade deverá ser ouvida e a Secretaria de Educação deverá justificar a necessidade de encerramento das atividades da/s escola/s, como medida que precede o fechamento. Antes de fechar a escola, a comunidade tem o direito de se manifestar e caso não concordem, a escola não poderá ser fechada! Neste sentido, a comunidade Araçatuba reivindica que a escola volte a funcionar na própria comunidade e não concorda com o htransporte dos estudantes para a cidade.

Cáritas Diocesana de Almenara - Baixo Jequitinhonha. Jequitinhonha/MG, 08 de março, 2018


Postado por: Comunicação ASA Minas
Editado por: Comunicação ASA Minas

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